06 de Julho de 2006 - (Quinta-Feira)
II
Dra. Regina Valadares era uma profissional conceituada
no bairro e na classe médica local. Médica pediatra, quarenta anos, um filho, vivia
um irônico antagonismo em sua vida: de um lado a ascensão na carreira profissional,
de outro um desastre na vida pessoal. Seu processo de separação litigioso se
agravava trazendo-lhe sérios problemas e grandes aborrecimentos. Seu marido,
Martin Valadares, quarenta e três anos, um jornalista de capacidade mediana, a
trocara por uma colega de trabalho, Priscila, também jornalista, mais jovem,
bonita... e esperta... Embora fosse ainda um relacionamento sigiloso, havia um
agravante: ele não era o único na vida dela. Sua “nova” namorada tinha um
“velho” alguém, há muito tempo, e estavam em conluio para “aplicar” um golpe,
sabedora que breve ele poria a mão em cinquenta por cento de alguns milhões. Em
verdade, até aquele momento, o acerto da divisão dos bens entre ele e a esposa transformara-se
numa batalha campal de processos e fóruns. Ofensas, humilhações de parte a
parte, eram pólvora pura para fazer eclodir uma disputa sem precedentes. No
embate dos advogados, nada indicava que ele seria agraciado com facilidades de
receber o que, muito certamente não trabalhara para ter. Por outro lado, ela,
resignada no seu papel de mulher e de mãe, não abria mão da sua parte no
patrimônio e nos destinos do filho; ele, em tom democrático, deixava para o
filho a decisão de com quem ficar, pois “era um rapaz crescido, emancipado, e
já podia decidir por si próprio”, dizia. Porém, no tangente a bens e valores
era irredutível: fazia questão dos centavos. E o impasse estava aberto. Pelo
visto, o divórcio entre os dois seria escrito em papéis escuros com tinta de
sangue...
Priscila, trinta anos, de uma família de cinco irmãos, era
oriunda de uma pequena cidade no interior paulista. Formada em jornalismo,
viera para a capital para tentar a sorte e encontrar um bom trabalho na área. O
que, de certa forma, não fora difícil. Com sua beleza encantadora, corpo
escultural, e, sobretudo com uma educação burilada pelas mãos rijas da família,
mas afetuosas no trato, saíra-se vencedora na sua procura: conseguira um
emprego de estagiária numa conceituada empresa jornalística. Depois de alguns
meses, com as suas qualidades e competência, firmara-se, passando a ocupar um
cargo na redação, já na condição de contratada.
De uma infância pobre e de dificuldades, queria muito
mais. O mundo? Quem sabe! O fato é que jurara para si mesma deixar a vida de pobreza
e de sofrimento, “nem que eu tenha que vender a alma, não quero nunca mais sentir
a dor das privações!”.
Durante um ano exercera eficientemente suas funções.
Nos últimos oito meses, fora alocada numa sala contígua à de Martin. Assim, nas
idas e vindas pelos longos corredores da redação, aliada à afinidade no
trabalho, ambos acabaram estreitando uma amizade que culminou, por parte dele,
num convite para “saírem para se conhecerem”. Ela, sabedora da sua condição de
casado, deixou claro que seria, de fato, somente para se conhecerem, sem
conotação outra qualquer. Martin, coração angustiado, carente de afeto, uma vez
que há bom tempo estava às turras com a esposa, fez desse momento com Priscila
o nascedouro de algo maior. Sentia-se no paraíso quando estava com ela, inalando
uma química que o fazia sair do eixo e desconcertar-se - uma mistura
contagiante de doçura, sedução... Esperta, ela entendeu que ali poderia estar
um “bom partido”, e que muitos dos seus problemas poderiam, enfim, ser
resolvidos. Não demorou, pois, a assentir aos seus apelos de namoro. Sigiloso,
no início, mas com o tempo não havia quem não soubesse do idílio entre os dois,
sob a promessa, dele, de “algo sério, tão logo estivesse divorciado”...
Entretanto, como sombra negra que insiste cobrir a luz
das pessoas que têm um passado com uma história mal escrita, havia um alguém
por quem ela se apaixonara e vivera um intrépido romance. No seu diploma de
bacharel ela trazia indelevelmente marcado, desde o primeiro ano de faculdade, o
nome de Alberto, rapaz que conhecera no campus. Com ele, qual um destino escrito
por mãos invisíveis, no futuro dividiria momentos importantes da sua existência...
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